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Mapa da Violência Política de Gênero em Plataformas Digitais

Mapa da Violência Política de Gênero em Plataformas Digitais. Relatório de Letícia Sabbatini, Viktor Chagas, Vinicius Machado Miguel, Gabriela Rezende Pereira e Sabrina Dray

Como a violência política de gênero atinge as parlamentares mulheres brasileiras? Quais são as plataformas digitais com maior e menor incidência de violência discursiva contra representantes políticas mulheres no Brasil? Que representantes são mais atacadas e por que razões? Como se dão esses ataques? Essas são algumas das questões que este relatório procura responder.

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Sumário Executivo

Este relatório está ancorado em uma análise multiplataforma, com dados extraídos ao longo de seis meses, entre julho e dezembro de 2021, do Twitter, Facebook, Instagram e YouTube. O estudo procura analisar as manifestações da violência política de gênero em tais plataformas, tratando dos ataques direcionados a deputadas federais e senadoras da 56ª legislatura. Considerando apenas as parlamentares que continham contas em pelo menos uma das quatro plataformas e aquelas que possuíam mandato ativo durante a composição deste relatório, partimos de uma base com 91 nomes, sendo 79 deputadas federais e 12 senadoras.

As menções a estas parlamentares resultaram em mais de 4 milhões de mensagens únicas somente nos seis meses em que os dados foram coletados. O estudo produziu uma amostra a partir destes conteúdos, de modo a observar como a violência política de gênero se manifesta, e comparar a sua incidência entre as diferentes plataformas.

A análise se baseia em três pilares: os temas dos ataques, as menções nominais às parlamentares e as correlações entre as variáveis analisadas.

Entre os principais resultados alcançados por este relatório, encontram-se os seguintes:

 
Do total de conteúdos analisados, 9% apresentava algum indício de violência discursiva contra parlamentares mulheres.
Entre as plataformas consideradas, o Twitter apresentou a maior quantidade de conteúdo violento, com cerca de 24% das menções analisadas sendo enquadradas como violência discursiva.
Embora haja mais ofensas no Twitter, é no Facebook que os índices de engajamento nos conteúdos que incorporam ataques a parlamentares mulheres mais aumentam. Isso significa que a violência política de gênero alcança maior visibilidade e desperta maior engajamento entre as audiências no Facebook.
Levando em consideração os diferentes níveis de ofensividade, observa-se que o insulto (41% dos ataques), a invalidação (26,6%) e a crítica (24,5%) são os modos de ataque mais acionados, somando mais de 90% das mensagens ofensivas que circulam no Twitter, Facebook, Instagram e YouTube.
A sátira e o humor provocativo estão presentes em cerca de 30% das mensagens ofensivas, sugerindo que os ataques frequentemente fazem uso de um expediente diversionista e dissimulado, ao pretender-se “apenas uma brincadeira”. Na prática, estes discursos camuflam e obliteram ofensas por meio de um certo tom jocoso e irônico.
A motivação dos ataques observados foi, principalmente, ideológica. Ofensas direcionadas aos partidos, às alianças, ou ao espectro político-ideológico foram encontradas em 22,3% das mensagens analisadas. Este dado evidencia uma das consequências da radicalização política e do extremismo.
Parlamentares mulheres de esquerda são duas vezes mais atacadas que parlamentares mulheres de direita.
Considerando os alvos nominais da violência política de gênero, a deputada Talíria Petrone (50%), a então deputada Profª Dayane Pimentel e a deputada Jandira Feghali (33,3%) foram as parlamentares mais atacadas proporcionalmente: pelo menos uma a cada três postagens direcionadas a estas parlamentares continham algum nível de violência discursiva. No caso dos partidos, PCdoB, PSOL e PMB foram os alvos mais visados.
Há uma forte associação entre conteúdos que mobilizam discursos misóginos, lgbtqia+fóbicos e racistas em todas as plataformas, mas principalmente no Facebook.
Tratando de possíveis estratégias assumidas pelos agressores, correlações entre ofensas em que prevalece a invalidação discursiva das vítimas e retóricas desqualificadoras e contestadoras são marcantes. O insulto e o tom jocoso das mensagens também apresentam forte correlação, sugerindo mais uma vez que os agressores justificam seus xingamentos como “brincadeira”.

Talíria Petrone, deputada federal, sobre o relatório

“O que esse excelente estudo nos traz é a constatação de como as principais plataformas digitais viraram arenas de disseminação do discurso de ódio e da desinformação. Estamos saindo de um período dramático da nossa história em que a violência política ganhou contornos gravíssimos, aliado ao fato de que as forças que estavam no comando do país financiavam a máquina de mentiras e de ataques à nossa existência. Estamos indo para o quinto ano do assassinato da nossa companheira e amiga Marielle Franco, portanto a violência política de gênero não é uma novidade. E quando o estudo nos mostra que nós, deputadas e senadoras de esquerda, somos duas vezes mais atacadas do que as parlamentares da direita, confirma também o espaço destacado que o discurso de ódio teve nos quatro anos de governo Bolsonaro.

Enfrento a tentativa de silenciamento da minha voz e do meu corpo político desde antes do meu mandato de deputada federal, o que se acirrou nos últimos anos. Isso é parte da conclusão de que, dos alvos nominais da violência política de gênero, fui a parlamentar mais atacada nas redes sociais. Um tipo de violência que também anda junto com outra constatação pelo estudo: a maioria das ofensas são insultos e invalidação da nossa capacidade de atuar como parlamentar.

Esses e todos os outros dados trazidos pelo estudo mostram que é urgente uma política de regulação das plataformas, que efetivamente fortaleça a democracia e freie os discursos de ódios e a desinformação. Sigo resistindo, ao lado de tantas outras companheiras também constantemente atacadas pela misoginia, a intolerância e o racismo. Não nos silenciarão nem nas redes sociais, e muito menos nas ruas e na tribuna das casas legislativas”.


Notas Metodológicas

Este estudo mapeou, entre julho e dezembro de 2021, período não eleitoral, e correspondente à 56ª legislatura federal, conteúdos publicados em quatro diferentes plataformas digitais – a saber, Facebook, Instagram, Twitter e YouTube – que faziam menção direta ou indireta a mulheres ocupantes de cargos públicos e no exercício de funções políticas. Para fins de simplificação, optou-se por trabalhar somente com parlamentares incumbidas de mandatos no âmbito federal durante o período de análise, e que possuíam conta ativa em pelo menos uma das quatro referidas plataformas, o que resultou em um total de 91 nomes, sendo 79 deputadas federais e 12 senadoras.

A coleta de dados de cada ambiente obedeceu a regras e procedimentos próprios, operadas a partir de distintos métodos de extração, e foi mais tarde uniformizada. Em todos os casos, adotou-se uma query com os respectivos nomes e nomes de usuário das parlamentares e suas correspondentes variações, nos casos em que houvesse nome ou sobrenome de escrita difícil e que pudesse gerar erros. Exceto em casos previamente conhecidos ou oficializados, não foram incorporados apelidos, nomes depreciativos, ou xingamentos direcionados às mulheres políticas, mantendo-se apenas e tão-somente as menções nominais e variantes ortográficas como sementes para a investigação.

A estratégia de extração de dados levou em consideração o interesse prioritário em captar manifestações ofensivas de usuários terceiros direcionadas a alguma das parlamentares. Dessa forma, ao invés de trabalhar com os posts e conteúdos publicados pelas próprias contas oficiais, guiou-se a coleta por comentários em posts e menções às parlamentares, a depender das funcionalidades das plataformas e dos graus de permissão de suas respectivas APIs. Assim feito, chegou-se a uma coleta inicial de dados de mais de 4 milhões de mensagens únicas, distribuídas da seguinte forma:

157.566 comentários de terceiros que mencionavam uma ou mais parlamentares no Facebook 70.589 posts de terceiros que mencionavam uma ou mais parlamentares no Instagram 319.481 comentários de terceiros que mencionavam uma ou mais parlamentares no YouTube 3.536.091 tweets de terceiros que mencionavam direta ou indiretamente uma ou mais parlamentares no Twitter

Em seguida à coleta, foram produzidas amostras aleatórias de cada um dos quatro segmentos de análise, a fim de compatibilizar os dados e permitir a comparação entre cada um dos corpora. As amostras segmentadas foram sorteadas das bases de dados originais, seguindo-se os parâmetros estatísticos de 95% de grau de confiança e 5% de margem de erro. O resultado continha 384 conteúdos analisados para o Facebook, 383 para o Instagram, 384 para o YouTube e 385 para o Twitter, totalizando 1.536 conteúdos para as quatro plataformas monitoradas.

Além da análise dos 1.536 conteúdos na primeira etapa deste estudo, o banco de dados foi recomposto para a segunda etapa, a partir da menção nominal às parlamentares mulheres brasileiras. Nesse caso, considerou-se apenas os conteúdos que faziam menção direta e explícita, no corpo do texto, a alguma dessas parlamentares, endereçando-lhe a mensagem. O objetivo era investigar os ataques nominalmente identificados. Para esta etapa, foram selecionados 634 conteúdos da amostra de 1.536 inicial.

Em todas as etapas do estudo, os dados foram analisados levando-se em conta 14 variáveis, sendo 12 variáveis dummies binárias e duas outras variáveis nominais. O livro de códigos e demais materiais de pesquisa utilizados para o presente estudo encontram-se disponíveis mediante consulta aos autores.


Créditos

Autores: Letícia SabbatiniORCID logo, Viktor ChagasORCID logo, Vinicius Machado MiguelORCID logo, Gabriela Rezende Pereira e Sabrina Dray

Ilustrações: Daniel Rios

Diagramação: Daniel Rios

Letícia Sabbatini é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (PPGCOM-UFF). Mestra em Comunicação também pelo PPGCOM-UFF. Pesquisadora do Laboratório de Comunicação, Culturas Políticas e Economia da Colaboração (coLAB/UFF) e da Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getulio Vargas (FGV ECMI). Desenvolve suas investigações com ênfase nas interseções entre gênero, comunicação política e tecnologias digitais.

Viktor Chagas é professor associado do Departamento de Estudos Culturais e Mídia e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (PPGCOM-UFF). É bolsista de produtividade em pesquisa (PQ-2) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e bolsista Jovem Cientista do Nosso Estado da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). É membro associado do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD). Foi bolsista CNPq de Pós-Doutorado Junior em Comunicação e Cultura pela UFBA. Doutor em História, Política e Bens Culturais pelo Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas (Cpdoc-FGV).

Vinicius Machado Miguel é doutorando no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense (PPGCOM-UFF), e mestre em Cultura e Territorialidades (PPCult), também pela UFF. Pesquisador do Laboratório de Comunicação, Culturas Políticas e Economia da Colaboração (coLAB/UFF). Tem experiência em Comunicação Visual, atuando principalmente nos seguintes temas: sociologia das emoções, economia política dos afetos e a relação entre cultura terapêutica e discurso de ódio.

Gabriela Rezende Pereira é bacharelanda em Midialogia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Foi bolsista de iniciação à inovação tecnológica (Pibinova) do Laboratório de Combate à Desinformação e ao Discurso de Ódio em Sistemas de Comunicação em Rede (DDoS Lab) da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Sabrina Dray é bacharelanda em Estudos de Mídia pela Universidade Federal Fluminense (UFF). É bolsista de iniciação científica (PIBIC/CNPq) do projeto “A política dos memes e os memes da política: mapa da memesfera política e do ativismo digital humorístico no Brasil” e pesquisadora do Laboratório de Comunicação, Culturas Políticas e Economia da Colaboração (coLAB/UFF).


Como citar este relatório

  • Em estudos acadêmicos:
1
SABBATINI, L.; CHAGAS, V.; MIGUEL, V. M.; PEREIRA, G. R.; DRAY, S. Mapa da Violência Política de Gênero em Plataformas Digitais. Niterói: coLAB/UFF, 2023. 57 p. (Série DDoS Lab). doi:10.56465/ddoslab.2023.002
  • Na imprensa e em outras fontes:
1
Relatório "Mapa da Violência Política de Gênero em Plataformas Digitais", de autoria de Letícia Sabbatini, Viktor Chagas, Vinicius Machado Miguel, Gabriela Rezende Pereira e Sabrina Dray, pesquisadores do Laboratório de Pesquisa em Comunicação, Culturas Políticas e Economia da Colaboração (coLAB) da Universidade Federal Fluminense.
DOI:10.56465/ddoslab.2023.002



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